segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Fotografia da intransigência

Nessa semana vivi uma circunstância constragedora em um órgão público. O que aconteceu que me fez refletir acerca do que as pessoas fazem quando estão de posse do poder.Fui até a  escola para efetuar a matricula  de meu filho e no bilhete havia uma solicitação de duas fotos para efetivação da tal matricula. Na fila da secretaria descobri que em minha carteira havia 1 foto e o cartaz, com letras grandes e grifadas de vermelho dizia: A matricula só será efetivada mediante as duas fotos: NÃO INSISTA!". Pendurei uma cara de paisagem enquanto a fila andava e ao chegar ao balcão abri pacientemente a carteira, retirei de lá a embalagem vermelha de fotos da familia e  e soltei aquela expressão surpresa:
__ OH! Só trouxe uma foto! 
A expressão de surpresa não colou. A secretaria me avisou secamente que a matricula não seria efetuada. Iniciei minha estratégia de negociação. Afirmei que meu filho poderia trazer a segunda foto depois que eu não poderia voltar, pois havia faltado ao trabalho para estar ali e não faria isso novamente. Lembrei-a que a foto não é documento legalmente exigido para matrícula. A secretaria permaneceu seca e afirmou que não faria a matrícula.
Como sabia que a fila atrás de mim não parava de crescer solicitei da moça uma declaração de comparecimento, pois iria recorrer. (Será que existe algum servidor público estadual que teme recurso?)
A moça disse que ia demorar e eu, com cara de poucos amigos, me finquei no balcão a fim de que ela percebesse minha disposição para esperar. Quando ela percebeu que eu não desistiria afirmou que a tal declaração só seria retirada na sala da direção. Perguntei onde era e renovei as esperanças em efetivar a matricula sem ter que voltar depois. 
Ao me sentar com a diretora expus minha demanda e soube que a ordem para não efetuar a matricula sem as tais fotos havia partido da mesma. 
Fui orientadora educacional por muito tempo e sei que esses procedimentos são um esforço da escola para garantir que todas as carteiras de identificação sejam feitas. No entanto sei que esse impedimento é ilegal e improdutivo, uma vez que quem não tem foto acaba obrigando a escola estender os prazos de qualquer forma, pois a matricula não pode ser negada.
Me espantei com a veemência da diretora em me negar o direito à matricula e mais ainda com sua ira em me responder quando solicitei a declaração de comparecimento:
___ Não vou te dar nada! Você não fez a matricula!
___ Mas se você me impediram de fazer....
___ Não vou te dar nada!
Argumentei me comprometendo a mandar a segunda foto através de meu filho uma vez que ele, como aluno, ia a escola todos os dias poderia entregar a tal foto com facilidade. Não consegui nada além da expressão raivosa:
___ Eu não vou brigar com você, mas você não vai fazer a matricula!
Emiti um quase murmurio:
___ Eu não estou brigando, quero apenas resolver meu problema.
Ela permaneceu irredutível.
Me lembrei que, se fosse recorrer, precisaria de provas de que estive na instituição. Me senti amarrada: se ela não me desse a declaração, como eu provaria que estive lá? No meus tempos de analista de educação já vi muita diretora escapando da advertência porque afirmava que nunca tinha visto o pai de aluno.  
A circunstância me obrigava a tomar atitude drásticas. Alertei-a que chamaria a polícia para, a partir do registro do boletim de ocorrência, provar que eu havia tentado matricular meu filho. 
Ela respondeu áspera:
___ Pode chamar!
O policial chegou meia hora depois e eu expliquei o que estava acontecendo. Ele já iniciou a conversa afirmando que sua filha estudara ali e que ele gostava das rigidez da escola pois lá tudo funcionava.  - XI, TOU FERRADA!-  pensei comigo.
Fomos novamente encaminhados para a sala da direção e diretora reiniciou a carga:
__ Se nós aceitarmos todas as matrículas sem a fotos, vamos ficar sem fazer as carteiras de identificação até o meio do ano.
__ Estou assegurando que meu filho trará a foto amanhã. É muito mais fácil para ele. Para mim no entanto será uma nova falta aos trabalho. Você está partindo do principio que ninguém é confiável, mas isso não é verdade.
__ Quer dizer que você não tem tempo para seu filho?
__ Que tipo de argumento é esse? Você está afirmando que eu estou tentando resolver isso hoje porque não em dedico a meu filho? Ou quer apenas me confrontar na frente do policial? Isso é completamente desnecessário!
Eu, que ainda alimentava uma pequena esperança de que a matricula fosse efetuada naquele dia percebi que tudo era inútil. A mulher não iria ceder. Convidei o policial para deixar a sala da direção e lembrei a ela que eu só precisava mesmo de uma prova de que eu estive ali e o Boletim de Ocorrência se prestaria a isso. 
Já do lado de fora uma secretária veio correndo dizer que não era para dizer no B.O. que eu havia sido impedida de matricular meu filho porque ela estava autorizando que eu fizesse a mesma até a terça-feira da semana seguinte.
Tive que rir. 
___ Como assim não me impediu? Eu estava saindo dali sem efetivar a matrícula por causa de uma foto. Eu  já havia entregado duas fotos no começo do ano. Pra que tanta foto meu Deus?
Levei um sermão do policial, questionando meu filho por não ter me avisado das fotos.
__ Mas ele avisou! Eu pensei que tinha as fotos na carteira, foi um engano, não um atentado ao patrimônio público.
Argumentei acerca de todos os direitos de cidadania que havia sido feridos naquela ocasião e o policial começou  a elogiar a policia mineira por sua competência e rigor.  Emendei um elogio a policia mas, já exasperada pelo ocorrido, levantei os braços em direção a escola e bradei:
___ Isso aqui é uma escola, não é uma instituição policial!
Peguei o número do B.O. e deixei a escola frustrada, envergonha e sem energia. Não sabia se o esforço de quase duas horas havia valido a pena. Ainda havia o risco de recorrer na secretaria da educação e expor meu filho a retaliações.  Com uma diretora tão intransigente não ficaria surpresa se isso acontecesse.
Como não sou de me intimidar me sentei com meu filho, expliquei o ocorrido e pedi para ele me contar qualquer eventualidade:
___ Se alguém respirar mais alto perto de você, me conte, tá!
E estou postando o recurso hoje. 

Norma de Souza Lopes

Um comentário:

  1. Norma, boa noite! Dias atras eu fui a uma agencia do INSS e vi lá pregado por todos os vidros da repartição que há uma lei dizendo que não podemos desacatar o funcionário público. E eles podem desacatar a gente, amparados na sua estabilidade e nesta lei? Pois é exatamente isso o que fazem. Eu já fui um ardoroso defensor dos funcionários públicos, mas hoje, não mais. Está quase todo mundo desesperado para fazer concurso público, se acomodar por tras da estabilidade e a gente (que paga a conta) fica refém desse sistema injusto. Não há mais movimentos coletivos e os próprios sindicatos fazem vista grossa. (e olhe que eu fui sindicalista por um bom período de minha vida). A coisa pública não pode ser transformada em apropriação particular por pessoas inescrupulosas. Muito bem feita a sua atitude, que tem o meu apoio. Abraços. Paz e bem.

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