domingo, 21 de agosto de 2011

Revisitando a solidão

Há algum tempo escrevi esse poema e achava que me aproximava da verdade das relações.
 
SOLIDÃO

A consciência da minha solidão me liberta 
Com ciência de que todos são máscaras 

Encontro real não existe  

Me amo hoje 

meu existir é o que há de real  

Solidar comigo  

com o outro apenas  

meros pontos de contato 

segundo efêmeros de toque 
 
Hoje sinto que devo reescrevê-lo. Me sinto sem coragem para rabiscar meus  escritos. 
No entanto o farei no futuro. 
Naquele momento eu pensava que conseguiria ser um EU verdadeiro e real, sem marcas deixadas pelo OUTRO.
Hoje sei que isso não é assim. Aquilo que eu chamava de pontos de contatos foram marcas que o OUTRO deixava em mim. Algumas indeléveis.
De mim mesma só tinha e tenho o desejo de ser. Desejo que sempre me escapa como um objeto escorregadio, desconhecido, inconsciente.
Se eu estivesse escrevendo esse poema hoje eu apenas diria
 
Meu desejo é o que há de real 
aspirações consolidadadas
na mistura entre o EU e o OUTRO.

NORMA DE SOUZA LOPES
 

sábado, 20 de agosto de 2011

Sobre a tristeza

Me bandeei hoje para os lados do Blog do Cacá e lá pude ler um belissimo texto acerca da tristeza e da alegria.
Refleti e comentei o que acho ser uma grande perda para nós, os pós-modernos. Nos tempos idos do amor romântico, do mal do século e de outras melancolias o individuo ganhava tempo para o luto,  para a dor e a introspecção que a realidade humana merece.
Hoje é tudo uma festa só. A euforia tem que ser evidente na cara do sujeito. Tristeza precisa ser escondida as custa de titulo de doença (depressão) ou combatida à força de remédio. Vivemos uma esquizofrenia coletiva na qual é preciso acreditar que tudo é e será sempre perfeito, que temos escolha, que o destino não existe e que controlamos a felicidade.
Eu, que ando fugindo dos grupos e dos consensos euforicos, me nomeei presidente do Partido da Solidão e sigo curtindo minhas tristezas. Elas me lapidam, me fortalecem e me mostram quem eu sou verdadeiramente - um ser livre, triste e feliz. Apesar da tristeza de me reconhecer a beira do abismo, da incerteza, do acaso e da mortalidade, posso fazer escolhas virtuosas.
E, se no interlúdio de fazer-me, eu acabar tendo coragem para atos heróicos que deem mais significado a minha vida, estarei sendo feliz assim, a despeito de minha conciência acerca das tristezas da vida.
Apesar de minha tristeza atávica.

Norma de Souza Lopes

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Construindo uma cronica descritivo-reflexiva



Segue exemplo com uma de minhas crônicasque se chama "Ruminando" e apresenta  caracteristicas tanto de descrição quanto de reflexão

RUMINANDO

Caminhar por Ribeirão por uma hora sem que se veja uma vaca é impossível. Ao dirigir pelas novíssimas ruas asfaltadas presenciamos as bovinas pastando nas avenidas sanitárias e caminhando pelos jardins ou várzeas municipais. As vacas são tão comuns nessa cidade que às vezes miramos as esculturas de concreto às portas dos açougues e quase sempre achamos que se trata de ruminantes vivas. (descrição da cidade e de suas peculiaridades)
Penso que essa presença evoca nos moradores as mais diversas reflexões, bem ao gosto do freguês. Há aqueles que ansiosos com o progresso atribuem à presença das vacas nas ruas ao atraso político do distrito. Outros encaram as mugintes como invasoras do recém-conquistado espaço urbanizado.
(reflexão acerca da descrição da presença das vacas na cidade de Ribeirão das Neves) Os carnívoros visualizam as mimosas salivado e conjecturando o esplêndido churrasco que poderiam experimentar.
A mim as vacas nevenses evocam outros pensamentos. Ao ver o balançar ritmados de suas ancas pelas ruas sou invadida por lembranças bucólicas de minha infância na Paraíba - São José das Piranhas para ser mais específica. O município que cito possui esse nome não por que tinha mulheres de vida fácil (ou difícil, como queira) entre seus moradores, mas por ter possuído no passado vastos açudes de piranhas - o peixe. (Descrição de uma característica da cidade da Paraíba)
Durante minha estadia na terra de José Lins do Rego pude experimentar uma relação muito próxima com esses animais. O espaço da rua de terra era das crianças e de toda sorte de animais. Cachorros, galinhas, bodes, vacas e infantes conviviam e brincavam de maneira pacífica e feliz. Ainda não se falava em doenças com o frenesi que discutimos hoje e talvez por isso pudemos chegar tão perto desses animais domesticados. Atualmente estamos limitando nosso convívio a uma pequena dúzia de pessoas. Nem de longe a relação é mais pacifica. (reflexão)
Como uma das características primordiais das crônicas são a reflexão acerca do cotidiano, deve-se elaborá-la usando a descrição como pano de fundo para alguma reflexão que se deseje fazer.

sábado, 13 de agosto de 2011

RANDÔMICO

Andei sumida Gwenever. Não falava contigo porque estava apaixonada por meu trabalho. Que se respeite essa paixão. Mas me afastar dele me fez perceber o quanto é alienante.Tenho rejeitado o retorno.
Quero mais é ficar por aqui, mergulhada em meu ninho, apenas observando seus passeios randômicos de lagartixa pelas paredes. Desfrutar da solidão em que me recrio a partir de meus pensamentos.
Meus pensamentos são você, Gwenever. Deslizam pela latitude da paredes desse mundo: a ciência, a psicologia, a filosofia e tantos outros exercícios inflexíveis do mundo plano. Mas, como você, eles não perdem a raiz malgaxe. O que talvez explique essa racionalidade reversa, esse casamento mestiço da razão com o primitivo, com a dança e a com a arte.
O que me faz temer o retorno ao trabalho é aquela em quem eu me torno quando tantos outros se imiscuem em mim. Eu, que na liberdade do meu abrigo posso ser ao avesso, transparente, hermética ou irreconhecível, na presença dos outros me vejo obrigada a ser uma só. O coletivo exige coerência. Mas ser uma só me faz sofrer. 
Por isso tenho amado essa solidão em que apenas você me frequenta, Gwenever. Você não é violenta, não parasita minha consciência. Apenas percorre comigo o caminhos ilimitados das posiblidades dos sentidos presentes nas palavras. 
Não quero voltar!
Me ajuda, Gwen?

Norma de Souza Lopes
 

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

FOTOGRAFIA

Me perguntam porque eu, um ator tupiniquim de tanta monta, voltei a pátria. Declaro  aqui a razão.Me expresso em prosa porque me cansa a poesia doída. Minha dor cabe mais em prosa. 
O que me dói?
Dói é saber que meu elo entre ela e a terra das oportunidades foi rompido. Não eram minhas.
Ela não era minha. A terra não era minha. E não era minha a fada de cabelos vermelhos, a princesa que por seis anos chamei de filha, pagiei como pai.
Pena os filhos não serem fruto de dois ventres. Poupava esse padecimento proibido de quem ama o que achava filho da carne.
Não pude ficar. Me faltava o bálsamo curativo das areias daqui. Ansiava espumas salgadas nos vãos dos dedos de meus pés cansados.
Com o Tio Sam deixei carreira, mulher, filha e sucesso. 
Construto simulacro da felicidade.  

Norma de Souza Lopes

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Episteme

Persigo palavras
sigo lavras
lavro pensamentos
abro valas
vasculho vales
cubro brechas
livro logos
minero ingressos
para o trem
que me leve
às vagas do universo
para que a onda
faça emerso
a felicidade
por fim entendo
que o exercício
do trajeto
no qual me faço
é o projeto
que mais vale
o trabalho

Norma de Souza Lopes

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Como fazer uma crônica

Bom, pensei em um formato ideal para uma crônica e ficou mais ou menos assim:
Pense em um fato do cotidiano, pode ser a politica, o contexto mundial, o ambiente familiar etc. Uma crônica ( de Cronos, o Deus do tempo) está sempre ligada ao cotidiano. Observe essa minha crônica chamada "Conversa de miúdo".
A mãe na pia, lavando aquela montanha de louça depois da bacalhoada e o miúdo sai com essa.
Observe que a narrativa é informal e intimista, uma conversa íntima entre ma~e e filho. Pode haver até a presença de diálogo:
_ Mãe, hoje tem escola?
_ Você quer dizer aula. Não filho, hoje é domingo de Páscoa.
_ Ah! Queria ir na escola hoje.
Observe a presença da oralidade em "Mãe, hoje tem escola?". Em uma crônica a fala coloquial pode aparecer. Na linguagem padrão o verbo ter não deve ser usado no lugar do verbo haver, mas isso é comum na linguagem coloquial.
O fato aqui - uma conversa entre mãe e filho é um pretexto para que o autor exerça sua criatividade, ou comunicar uma angústia. Nesse caso expressei um inconformismo com algumas escolas mostrando a alegria de uma criança com sua escola. Uma crônica pode apresentar um certo lirismo, ou seja, uma linguagem com tom poético. Sinta a poesia e a leveza nesse conversa.
A mãe se vira e lança um olhar curioso para o filho.
_ Minha professora contou que a páscoa não é só o ovo de chocolate. Ele contou de Moisés, e de Jesus também. Sabia que ele ressuscitou, mãe?
_ Sabia, filho.
_ Mãe, você achou bonita a ovelha que eu pintei?
_ Achei linda, filho.


_ A professora deu um bombom junto. Todos na escola ganharam. Você acha que a escola gosta da gente, mãe?
_ A escola são as pessoas que trabalham nela filho, suas professoras, os funcionários, a direção. São eles que gostam de você.

_ Minha professora gosta de mim. Ela brinca comigo, e até está me ensinando a ler, né mãe?
( observe novamente o uso coloquial do "contou de Moisés" "a gente" e o  né no lugar de "não é, mãe?"
 _ Todos gostam, filho. As pessoas que trabalham na sua escola escolheram isso porque gostam de criança e gostam de ensinar.
_ Tem criança que estraga a própria escola, mãe. Eu não faço isso nunca. Acho minha escola linda.

Diz coisa séria por meio de uma aparente conversa fiada.
_ Nem todas as escolas são como a sua, meu pequeno. Há lugares em que as pessoas pensam diferente, acham que escola são pequenas fábricas de construir aprendizes. Se esquecem de presentear e de brincar por acham que isso não é importante.
_ Ainda bem que minha escola é não é assim, né mãe.
_ Ainda bem filho.

Uma crônica deve ter natureza ensaistica, ou seja ser breve, fazer criticas de maneira leve, expor idéias e reflexões filosofica a cerca de um determinado tema.
Uma crônica deve ainda ser falar um fato moderno, sujeito a transformação e a fugacidade da vida moderna. Lendo a crônica acima sabemos que o que ela relata é transitório, que qualquer evento poderia mudar os rumos dessa conversa, até mesmo o tcar da campanhia. A sensibilidade no contato com a realidade sem falar muito, em forma de sintese dá o recado de uma crônica.
Norma de Souza Lopes

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Poucas coisas tem me arrancado desse racional cotidiano. Por algumas me deixo atravessar. Foi o caso desse poema de Viviane Mosé, que rasgou um intervalo em mim.

O tempo

quem tem olhos pra ver o tempo
soprando sulcos na pele soprando sulcos na pele
soprando sulcos?


o tempo andou riscando meu rosto
com uma navalha fina
sem raiva nem rancor
o tempo riscou meu rosto
com calma

(eu parei de lutar contra o tempo
ando exercendo instantes
acho que ganhei presença)



acho que a vida anda passando a mão em mim.
a vida anda passando a mão em mim.
acho que a vida anda passando.
a vida anda passando.
acho que a vida anda.
a vida anda em mim.
acho que há vida em mim.
a vida em mim anda passando.
acho que a vida anda passando a mão em mim
 


e por falar em sexo quem anda me comendo
é o tempo
na verdade faz tempo mas eu escondia
porque ele me pegava à força e por trás
um dia resolvi encará-lo de frente e disse: tempo
se você tem que me comer
que seja com o meu consentimento
e me olhando nos olhos
acho que ganhei o tempo
de lá pra cá ele tem sido bom comigo
dizem que ando até remoçando