segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Pretérito Imperfeito

A gente se sentava às bordas das casas à noite porque naquele tempo não havia calçada, só uma terra vermelha, um pó fino nas épocas secas e muita lama em épocas de chuva, o que era apropriado para o jogo de finca e de bolinhas de gude. 
Oito,  nove garotos, algumas meninas, mais garotos que garotas. Eu estava sempre no meio. Ter irmãos meninos me abria algumas portas. Tratávamos de tudo, apelidar os adultos,  aulas de Nuncgaku (pau de vassoura amarrado com barbante), cobra de meia na rua, histórias de terror, salada mista, tamanco de lata, perna de pau, carrinho de rolimã.
Então eu me pego contando isso e parece que todas as ocasiões em que brinquei em minha infância cabem num único pacote. Me pergunto porque contamos o passado assim como se ele fosse  um pretérito imperfeito que se repetiu infindáveis vezes, quando a maioria das coisas aconteceram apenas uma vez. 
O fato de você me emprestar as revistas do Fantasma  é um exemplo. Quantas vezes você fez isso realmente? Parece que foi a minha infância toda. Mas será mesmo? E quantas vezes nos realmente brincamos juntos, viajamos juntos, conversamos sobre fotografia? 
E o pior, de maneira bilateral nos relacionamos depois de jovens. Eu, como de costume, amando mais. O amor acabou e você me fez lembrar o dia em que mandou uma carta de amor colada dentro de uma das revistas, fato do qual em nem me lembrava. E eu fico aqui tentando catalogar a memória, lembrar qual revista, lembrar que palavras de amor seriam essas. Não me perdoo por ter ignorado a maldita carta na infância. É como se ela sozinha pudesse ter interrompido todas as minhas outras trágicas histórias de amor.

NSL
18/08/14

2 comentários:

  1. É cara Norma, devemos notar cada detalhe, nos importar mais com coisas que no momento não são aparentemente tão importantes. Se você tivesse lido a carta, pensa só... Quantas coisas não poderia estar diferente hoje ?
    Mas acredito que no fim, tudo tem um porque.
    Mas sempre vai haver aquela duvida, a famosa "purga atras da orelha" né?! Ainda mais quando é sobre o amor.
    - Abraços.

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  2. É isso, acho que amor e certeza não combinam, Ananda. Abraços

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