segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Em outubro ele faz vinte. E sempre me pareceu muito feliz. Acho a alegria dele tão preciosa que acabo facilitando sua vida, protegendo-a como quem guarda uma pequena brasa.  Isso causou alguns estragos. Nada que a própria vida não se encarregue de corrigir. 
Gosta de conversar sobre tudo, fazer perguntas, sondar primeiro antes de viver. Lembro-me de uma vez que ele me fez descrever como seria um beijo por mais de meia hora sem nunca demonstrar estar satisfeito com as respostas. Mandei ele ir viver. Ele não me deu alternativas.
Conversávamos hoje sobre os rumos que sua vida vai tomar e ele parecia preocupado com as mudanças. Disse para não se preocupar pois as coisas costumam dar certo para caras como ele. Ele me pediu para explicar. Decidi usar a mim mesma como exemplo numa alegoria na qual uma criança sofre uma queda enquanto corre. 
__ Suponha que sou uma menina que está correndo e brincando. Então esta menina sofre uma queda grande o suficiente para ralar os joelhos e sangrar. Sou o tipo de menina que fica no chão chorando, soterrada pelo ressentindo com a queda. A vida não costuma ser boa para meninas assim. Já você é alguém que cairia, avaliaria o sangue nos joelhos ensaiaria o choro, olharia os colegas correndo à sua frente, desistiria do choro e continuaria correndo. Com esse tipo de menino a vida costuma ser muito generosa. 
Ele riu e perguntou se sempre haveria a queda, se não dava para evitá-la. Não expliquei muito, acho que ele já sabia a resposta. Sempre haverá uma queda. Não fez nem uma pergunta sobre meninas que ficam chorando no chão. Isso ele já sabe. Desde que nasceu assiste ao triste espetáculo em que tento afastar os escombros e me levantar. 

NSL
11/08/14

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Você escreve muito bem *-*
    Virei uma admiradora, sério.. Vou visitar seu blog sempre.
    - Me identifiquei com o tipo de menina que que fica no chão chorando, soterrada pelo ressentimento causado pela queda. Quedas são inevitáveis, queria que fossem extintas e tudo desse certo... Mas, só de pensar assim já estou errada rs'
    Fico encantada com o tipo de gente que analisa o sangue, engoli o choro e continua correndo.
    Mas é tão difícil pra mim enxergar desta forma, o mundo é tão grande e eu tão pequena, eu sou só eu e o mundo é tão mundo.
    O jeito é sempre arrumar uma cara boa e seguir em frente, o mundo não uma fábrica de realizações de desejos.
    Esse triste espetáculo em que tento afastar os escombros e me levantar parece nunca ter fim, mas sei que vai ser assim sempre como um circulo ou melhor, um ciclo.. Eu vou cair, tentar afastar os escombros para me levantar.
    Eu sempre vou acreditar numa possível reviravolta.

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  3. Muito obrigada, você me honra muito com suas palavras. E quanto aos modelos, não importa a nossa escolha, ser a menina que chora, o menino que corre. Sei que sou a menina e aceito-a. Como você, admiro outros que tem sucesso mas reconheço minha vulnerabilidade. Ela é minha condição de existir. Acontece às vezes de eu me levantar, Nestas ocasiões corro. corro muito. Isso fez de mim a mãe que sou, a profissional que sou a mulher que sou e inclusive a escritora que sou. Talvez isso seja o que você tenha chamado de reviravolta. É isso menina. É isso que somos. Meninas que choram (e correm) Abraços.

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  4. É a realmente isso que quis dizer. Formar uma família, ter uma profissão, ser alguém... Em fim.
    Aceitar nossas vulnerabilidades... No fundo não é tão mal assim. É isso que somos e temos que aceitar.
    Eu aceito, quer dizer tem momentos que eu surto e fico no chão, mas depois eu corro. Cada um tem um jeito diferente (ou nem tanto) de enfrentar as coisas que vem. Eu aceito.
    Nada como um dia apos o outro.
    - Abraços.

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