quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Desarmada

Se destaco de minha boca
meus dentes, há tanto bambos
e os ponho às palmas de meus adversários
feroz não luto
pelos espólios
de míseros latifúndios

Se às vezes abro a porta
displicente e tola, e acomodo
na cama, confortáveis, os meus contrários
já não temo
sei que sendo sólida
nada será usurpado

Na boca, a lacuna vazada
não mais me envergonha
portas abertas
vampira às avessas
sem dentes
mamo melhor as tetas da verdade


Norma de Souza Lopes

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Cena de jardim


Um gatinho
com sua boca
mordisca uma florinha
emília serralhinha

Tão cândida a cena
que virou poema

Norma de Souza Lopes

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Marés

Lá, ondas
aqui, sombras
Marés


Fico
e me engole a penumbra
vou
e me esmagam as vagas

No escuro
abrirei as janelas
lançarei o barco

Olhos no farol
a consciência acesa

Silêncio!!!!
mulher navegando
entre ondas
e sombras

Norma de Souza Lopes

Poeminha para Paulo Lobo

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Quando os Djs envelhecerem
e os skaitistas forem anciãos
quem serão
nossos icones da juventude?

Descoisificando-me

O poder não é para ser conquistado, ele deve ser destruído.
Jen-François Brient
 
Minha vingança
subverter a ordem das coisas
das coisas ordenadas
que eu consumo
quero ser feliz sem coisas
ser feliz sem ser coisa

Norma de Souza Lopes


 

Uma pequena neurose na quarta-feira de cinzas

Concisão
com cisão
pouca palavra
muito pensamento
nunca sair
de dentro
metade amor
metade medo
em segredo
coser
ser duas
todas
nenhuma

Norma de Souza Lopes

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Resenha: A Flor do deserto

Aproveitei o carnaval em casa para ler "A flor do Deserto" livro memoríalistico de Waris Dirie, uma grande modelo que nasceu na Somália em uma tribo nômade do deserto africano. A modelo nasceu numa família de 12 filhos e fez sucesso na Europa e nos EUA.  Waris relata sua infância como pastora de carneiros e camelos e as brincadeiras com os irmãos. Conta como, aos cinco anos, sofreu a mutilação imposta pelas tradições da tribo e teve arrancado clitores e lábis vaginais, ficando com apenas um pequeno furo por onde, com dificuldades, podia urinar.
Aos treze anos seu pai engedra um negócio de casamento de Waris com um senhor de sessenta anos em troca de cinco camelos e a menina inicia sua fuga. Ela relata sua  viagem até a casa de parentes em Mogodíscio, capital da Somália, onde foi acolhida mas explorada pelas tias. Quando escolhe ir para Londres para casa de uma tia pensa estar livre mas continua, por quatro anos, sendo explorada como doméstica.  Quando a tia e seu marido diplomata anunciam o retorno para a Somália Waris decide ficar e trabalhar como garçonete no McDonalds. Mora durante um tempo na Associação Cristã de Moços até ser descoberta como modelo.  Casa-se com um inglês em troca do visto mas é perseguida pelo mesmo durante muito tempo. Waris encerra o livro contando do seu orgulho em aceitar o cargo de Embaixadora da ONU e como se sente feliz em lutar contra a mutilação feminina.
Apesar dos relatos acerca da tradição desumana de mutilação, achei que o trata-se mais de uma bela história de auto superação 

Norma de Souza Lopes

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Bala Perdida

Quando ouço tiros
reconto meus filhos
confiro a família

Nada me tira
do pensamento
que a bala perdida
me desintera
dos meus.

Norma de Souza Lopes


Norma de Souza Lopes

Leve mão leve

Por cinco reais
arrastados com dedos agéis
de dentro de uma pasta preta
e o policial federal
não atrasou a volta
de meu ônibus para casa
e para a minha vida
de mudança

Não queria ter mudado
queria mudado
o policial
daquela estrada

Norma de Souza Lopes

Ancorada

Sem lugar
no mundo
no corpo
na vida
vaguei
até achar
a estaca que me fincava
a palavra

Norma de Souza Lopes

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Miragem

Essa sombra no meu rosto
semblante sisudo da tristeza
é farsa

O que me segue
o passo no meu encalço
que amarra minha cara
é raiva

Do sono perdido
e da falta de sentido
da vida

Norma de Souza Lopes

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Epitáfio ao mensageiro das manhãs

A poesia que havia
no canto de dois galos
deixados ao meu encargo
cessou-se

Tratei de alimentar e
saciá-los
mais um galo morreu
e não há poesia que conforte

Depois do galo morto
Não me dei pelo fato
e o odor da morte
espalhou-se pela casa
grudou em minhas narinas

o enterro sai hoje
o endereço do velório
certamente é um aterro

Não me visitem
pois estou de luto
e casa fede muito

(minhas manhãs morreram um pouco
no canto daquele galo)

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Cura


Se me lê
vê como tenho me curado
bastou uns chás
e um tratado de poesia


Norma de Souza Lopes

Insônia

No meio da noite
o desprezo acordou-me
náusea da condescendência sutil
dos que afirmam
aprovar-me

Sua bondade
em gostar-me apesar
de todo meu orgulho
não me expande

O orgulho
espinho na carne
requer dentes à mostra
requer rejeição
visto que sustenta
o eu ilusão
plantado em mim
por meus pais
e pelo ego
deve ser arrancado
sem complacência



(Mentira
O que me acordou foi a poesia)

Norma de Souza Lopes

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Sombrio



Sem luz
minha sombra move-me
emoção projetada
criada no branco da página

E a mancha
teste na prancha
malha na carne
mácula na vida
não passa
de bela figura no muro

Meu obscuro não me assusta
verdadeiro susto
é a norma cravada na alma

Norma de Souza Lopes

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Canção para trazer de volta o amado

Mais que ontem
eu sou do meu amado
atrasado
mas em tempo

O amor pousou 
passarinho em meu ombro
eu voo com ele
e já não estou com saudades

NSL
05/02/12

Lugares

ocupados
desocupados
reocupados
preocupados
lugares sou eu me esvaziando
plantando espaço dentro de mim
para novos lares
novos i-móveis

Norma de Souza Lopes

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Tarde


Na cadeira
me sento ao contrário
desobedeço a coluna
que condenou ao  esquecimento
quem desatou minha poesia

Se minha sombra me comanda
trabalho
e a poesia me abandona


Perdi o amor na esquina da realidade
agora sou tarde
já não tenho idade 
pra desperdiçar vontades


Norma de Souza Lopes

Entre o rio e o mar






De tudo que vi na Bahia
mais me agradou
a preta lama do manguezal


O cinza meio ambiente 
de Belo Horizonte
nem de longe
tanto me comove


A miríade de seres
entre o rio, o mar e o verde
recordaram-me as águas amorosas 
do pantanal de Manoel de Barros

Eu, que gosto de alaranjado
vidrei no brilho dos caranguejos
e de longe vi os turistas 
dignamente
banhando-se no cheiro de enxofre


No fundo todo aquele barro
berçário de tantas vidas
lembrou minha essência
minhas raízes enterradas na lama
repletas de sedimentos
sempre entre o rio e o mar


Norma de Souza Lopes


Mensageiros da manhã


Cedo me seduz o sono
cedo a manhã me acorda
mas não vem sozinha
manda para o meu terreiro
dois galos aprendizes
que a duas semanas ensaiam
e finalmente, em uníssono
cantam o aviso matutino
_ Levante-se que as férias acabaram
é hora de trabalhar.

Norma de Souza Lopes