quarta-feira, 28 de junho de 2017

Todo amor - Gagan Gill - Tradução de Norma de Souza Lopes

Quando chega à sua porta, a primeira coisa que todo amor
pergunta é: você pode pular da janela por mim? Você pode esfaquear seu coração por mim? Todo amor pergunta isso: você pode voar por mim 
com seus braços amputados?

Quando o amor chega na sua porta, não vai sair em breve.
Tem que ir para alguma montanha ou vale. Para um oceano ou rio.
Ele vem à sua casa do nada e quer saber se
você vai se afogar com ele ou não.

Todo amor dá tempo suficiente para você morrer completamente.


Daqui ó http://www.poetrytranslation.org/poems/every-love 

terça-feira, 20 de junho de 2017

Pera - Alejandro Aura - Tadução de Norma de Souza Lopes

Estava eu descascando uma pera distraído
contente de servir-me o desjejum,
quando de repente notei o pouco pudor
com que se deixava eliminar a vestimenta
e como soltou umidades e como me escorrias pelos dedos
um jogo lúbrico que me pedia certo pudor que nesta matéria eu havia perdido
e não por isso eu a sentia menos densa e doce
acomodar-se à temperatura de minhas mãos;
a nomeei suavemente no reino das frutas,
a chupei, a mordi, a fiz minha
e escrevo seu nome para que não se apague a memória dos
séculos: pera.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Não Confie - Abel Feu - Tradução de Norma de Souza Lopes

      Te queixas às vezes —e te pões
bastante irritada, e por isso
aliás, não te ofendas— porque dizes
que meus versos te querem mais que eu.
     Bom, bom. Poderia replicar-te, mas, oh!,
te conheço de sobra,  não me ouvirias,
assim, tudo bem, valeu, O.K., d'accord.
E não é por defender-me, mas, ei,
ao menos, digo eu, se estás de acordo,
poderíamos discutir isso? O que você acha?
     Porque, vamos, Que fazem eles por ti?,
Então, o que fazem? Te acompanham? Vão
contigo ao cinema, para um passeio? De bicicleta?
Te escutam quando está de blá blá blá?
Te chamam todo dia —repitopitopito:
todo dia (que pequena conta)—,
por telefone? Einh?
     Tenha cuidado, são ilusão. Não confies
em nem um verso. Mira que eles
—depois não venha dizer que não avisei—,
eles te querem,  apenas, de palavra.
 
http://andresvara.blogspot.com.br/search/label/Abel%20Feu

domingo, 18 de junho de 2017

O pacto de Alfonso Brezmes - Tradução de Norma de Souza Lopes

Se me acende, não aguardes
de mim conversa fiada,
os desgastados ritos do amor,
as consabidas normas,
os regulamentos mais toscos
que matematicamente predizem 
como tudo se tece e destece.
Se me prendes,
não me venha com lenha para um dia
que acaso nunca haverá de chegar,
não me venha brincar o jogo proibido,
se ignora a aritmética e o cálculo.
Não te cubras, não conserves:
organize tua vida para o fogo.
Este é o pacto: se me incendeias,
arde comigo.


Daqui ó http://andresvara.blogspot.com.br/2016/01/alfonso-brezmes.html

sábado, 17 de junho de 2017

poiesis

quantos são os poeta hoje?
me perguntam
e sou obrigada a dizer: menos do que precisamos
é mortificante que tão poucos sejam poetas

mesmo estes mitos desamparados 
essas nuvens errantes 
beija-flores sedutores
mesmo esses
nos trazem algum alento

é tão triste
a falta de poesia em um homem

sexta-feira, 16 de junho de 2017

adicta


escrevo versos
como quem passa o chapéu
a espera de moedas, o amor
a poesia me consome
como um vício
ou seria a paixão?
lembro-me de tuas mãos

tão bonitas
mas inúteis para mim


(ninguém viu
mas no  verso em branco
eu disse seu nome)


August Rodin (1840-1917)

 

quinta-feira, 15 de junho de 2017

fôlego

repousa descuidado
sobre esse nome: meia-noite
ignora a potência de meu fôlego

se abre só por um instante a boca
assopro entre seus dentes
um sol de amarelo ardente

sou a mulher em chamas

Imagem de Antonio Lee

quarta-feira, 7 de junho de 2017

quando chega a hora


Eu vi uma mulher e ela moldava um pote em volta de si
Ela guardava a si, suas melancolias, sussurros e medos em um pote

Mas um dia as guerras se instalam e chega a hora de partir
e uma mulher precisa saber viajar discretamente
levar a penas o necessário
sonhos, um caderno, um vestido vermelho

Uma mulher não deve se compadecer de seus sapatos velhos
ainda que implorem: "fica"
que supliquem para que ela continue a dançar
uma mulher deve seguir caminhando sem esquecer que
sem ela eles são apenas um corpo vazio num salão

Uma mulher precisa cuidar para não deixar
os olhos perdidos nalguma gaveta

Quando chega a hora, uma mulher precisa marchar
no caminho, animais perigosos, rios turbulentos
há que evitar novas jaulas, violências
mas vale seguir o curso do rio
sempre é possível saber para onde vai um rio

RUDE Manuel Arana Tradução de Norma de Souza Lopes

Por muito que me esforce
(talvez, por isso eu nem tente)
esse nunca será um bom poemário.

De qualquer maneira, serei sincero contigo.
Quando alguém ensina seus poemas
sempre pretende algo, sempre:
Aprovacão, se estás seguro de que são bons.
Ou críticas construtivas para poder refazê-los
se não as tem todas contigo.
Embora existam duas reações que realmente buscamos.
Uma é conseguir que alguém se sinta contemplado
nos poemas e diga “isso era o que eu sentia”.
Porem a mais esperada
(é que, por desgraça, menos se escuta)
é que o destinatário real dos versos
responda corretamente a todas as tuas perguntas.
Em meu caso seria algo assim como
“deixa já de poeminhas
e vem aqui, porra”.
Daqui ó https://www.google.com.br/amp/s/hectorcastilla.wordpress.com/2012/09/28/manuel-arana/amp/

domingo, 4 de junho de 2017

ontem

tantos versos apagados
até chegar a um poema
me amarrasse ao mastro
e plantasse cera 
em meus ouvidos

nada disso funcionou
a julgar pelo mergulho 
em seus olhos











sexta-feira, 2 de junho de 2017

essas coisas que não se suplicam

há três noites não durmo direito
desamor à beira do nada
procuro fora do tempo
uma palavra que não soe
como grito de socorro
desespero a espera de amor
por puro pânico sussurro meu nome

quinta-feira, 1 de junho de 2017

nada a fazer contra o desperdício

repito palavras para trazer à memória
imagens apagadas por segredo e susto
nada a fazer contra o desperdício
dias em que tu, mais uma vez
não pousou tuas mãos
sobre minha nudez
de doce e outono

amanhece e meu corpo sussurra, "entre"
meu coração se cala, porém
isso de sermos feitas
do que não se estabiliza
há de atrasar por séculos
um encontro épico