gosto de não trabalhar no centro
isso faz com que a cidade se torne especial
é manhã de segunda do último dia do mês de julho
aqui nesta fronteira do mundo
carteiros e coletivos estão no horário
torço pela volta dos dias de verão no chafariz
da Praça da Estação, onde até os sem-teto são literários
nesses dias líquidos, cheios de jogos e de imagens
trabalhadas, encontros analógicos são a melhor experiência
você fica sempre tão bonita vestida para sair
virava fácil um graffiti dos gêmeos
o silêncio sempre me pareceu algo bem desafiador
talvez por permitir qualquer palavra no seu oco
talvez por eu nunca ser capaz de me calar
há um rumor do que você não diz
que conversa com essa mulher estranha
e selvagem que eu sufoco em mim
pouca gente sabe, mas depois de Ten
Eddie Vedder nunca mais foi frentista
saber se rasgar às vezes nos tira do lugar
mas já entendi que você não vem
o que me transforma nesse replay
infinito dos últimos verso de Black
segunda-feira, 31 de julho de 2017
Dois poemas de Sam Shepard - Tradução Norma de Souza Lopes
Desde a grama alta
até borda do pátio asfaltado
te vejo me esquadrinhar
te vejo quando não sabes que miro
e cada mirada que roubo
adiciona um dia a minha vida
ultimamente está mais difícil de te capturar
ou estou ficando velho
ultimamente está mais difícil de te capturar
********
Já vi praticamente
todos os narizes arrumados
todos os dentes clareados
e todas as tetas remoçadas
que posso suportar
Vou regressar
à mulher natural
daqui ó http://emmagunst.blogspot.com.br/2010/05/cronicas-de-motel-2.html
até borda do pátio asfaltado
te vejo me esquadrinhar
te vejo quando não sabes que miro
e cada mirada que roubo
adiciona um dia a minha vida
ultimamente está mais difícil de te capturar
ou estou ficando velho
ultimamente está mais difícil de te capturar
********
Já vi praticamente
todos os narizes arrumados
todos os dentes clareados
e todas as tetas remoçadas
que posso suportar
Vou regressar
à mulher natural
daqui ó http://emmagunst.blogspot.com.br/2010/05/cronicas-de-motel-2.html
sábado, 29 de julho de 2017
tão potente quanto suas mãos
o que parece ser a sua beleza
esteve sempre depositada
em minhas retinas e as meninas
dos meus olhos são volúveis
podem amar milhões
tivesse sido atento
teria entendido meu fetiche
por suas mãos
agora não importa mais
antes de desistir preciso dizer
porque não aceito tão pouco
pontes são melhores
que escadas, pseudoencontros
consistência fluida
me fazem esquecer
que a minha história
é mais bonita
que a do Robinson Crusoé
sei que é o clichê
mas quem perde é você
meu veneno mais doce
será te olhar e te ver
tão desimportante
quanto verdadeiramente é
não raro um poema
assassina projetos de amor
ouça os gritos
este ordena
PARE DE SE RASGAR
não é de hoje que costuro
as recusas com palavras
esteve sempre depositada
em minhas retinas e as meninas
dos meus olhos são volúveis
podem amar milhões
tivesse sido atento
teria entendido meu fetiche
por suas mãos
agora não importa mais
antes de desistir preciso dizer
porque não aceito tão pouco
pontes são melhores
que escadas, pseudoencontros
consistência fluida
me fazem esquecer
que a minha história
é mais bonita
que a do Robinson Crusoé
sei que é o clichê
mas quem perde é você
meu veneno mais doce
será te olhar e te ver
tão desimportante
quanto verdadeiramente é
não raro um poema
assassina projetos de amor
ouça os gritos
este ordena
PARE DE SE RASGAR
não é de hoje que costuro
as recusas com palavras
quarta-feira, 26 de julho de 2017
A verdade sobre a poesia que ninguém contou
Tive dias em que um arco-íris
era apenas refração da luz solar em gotas d'água
que o som dos pássaros só comunicava sua fome
que um náufrago era aquele obrigado a continuar vivo
Eu pensava que não existia poesia.
segunda-feira, 24 de julho de 2017
simulacro
irremediável como tombar
é não caber no próprio nome
quem me ensina a morar no agora?
ontem descobri que não aceitei
o convite para o encontro com o tempo
do fundo do abismo toco um tamborim
é não caber no próprio nome
quem me ensina a morar no agora?
ontem descobri que não aceitei
o convite para o encontro com o tempo
do fundo do abismo toco um tamborim
sábado, 22 de julho de 2017
oblíqua
para Val Armanelli
quase felina, um assopro de voz
há tantas em você, fazendo elo
fantasia e sonho, heroína
um dia me olhou, menina oblíqua
e eu quis ser sua mãe
balada pelo retorno do verão
quem me atravessa
não imagina que marcas
deixa em mim
melhor que seja assim
anseio o retorno do verão
frio e ausência
não é nome para tristeza
por que todos parecem mais felizes
quando as temperaturas sobem,
quando se afasta a solidão?
o que é real para você?
sombras também são verdade
a solitude é boa companheira
se não vai me tocar não me chame
se pretende me mudar não me ame
o que é real para você?
estivesse no mar
poderia dizer que o som de ondas
é tão real quanto o crack
de meu coração partido
já passou, parei de sangrar palavras
me abraçar em seu travesseiro
pode te satisfazer
mas e daí, o que é real para você?
quarta-feira, 19 de julho de 2017
déjà vu
há algo diacrônico
em se escrever poesia
primeiro se repete
à exaustão
o que se é
sem ser
traduzido o ser
nos ocupamos em o desvanecer
descrevendo outros objetos
soubéssemos o não-azul do céu
nunca o pintávamos
em se escrever poesia
primeiro se repete
à exaustão
o que se é
sem ser
traduzido o ser
nos ocupamos em o desvanecer
descrevendo outros objetos
soubéssemos o não-azul do céu
nunca o pintávamos
a dor não tem força para frequentar manifestações
a despeito do vício
de acontecimentos
para o futuro
crianças são agora
saraus estão lotados
e é isso que importa
de acontecimentos
para o futuro
crianças são agora
saraus estão lotados
e é isso que importa
terça-feira, 18 de julho de 2017
Nadia Escalante Andrade Não tinhamos água em casa, lá fora chovia Tradução de Norma de Souza Lopes
Não tínhamos água em casa, lá fora chovia
Levamos os baldes e panelas
para encher com a chuva.
Sentados na calçada , esperávamos.
Parecia que a água inundava a rua, porém não os recipientes.
O ar, no entanto, entrava mais forte em nossos pulmões,
e era mais ar que o ar da casa,
era como água que não decidia
a encher-nos por dentro,
e se derramava pelos braços, umedecia a roupa
e resvalava até o pés como uma sombra.
Era lenta a generosidade da água.
Podíamos ver o fundo da panela,
de aço que parecia lentamente
encher de si.
A água tornou-se sólida e dura como o material que a abraçava
parecia ondular ao ir se preenchendo.
Respirávamos o ar com preguiça
enquanto sorríamos absorvidos pelos sons
que caiam fora do nosso silêncio.
A água acumulada era livre,
um só substância dentro do metal.
Transbordava e tivemos a satisfação de ver um corpo
sair de seus limites sem deixar de estar cheio ao transbordar
Também nós fomos recipiente,
cheios do som da água, respirando
o ar da chuva que não havia em nossa casa.
Nós miramos transbordar e sorrimos; éramos livres,
uma só substância cada um,
dois corpos de superfície generosa,
e no fundo de nós, a água própria
que ondulava o material do recipiente.
daqui ó http://www.laotrarevista.com/2010/08/nadia-escalante-merida-mexico/
Levamos os baldes e panelas
para encher com a chuva.
Sentados na calçada , esperávamos.
Parecia que a água inundava a rua, porém não os recipientes.
O ar, no entanto, entrava mais forte em nossos pulmões,
e era mais ar que o ar da casa,
era como água que não decidia
a encher-nos por dentro,
e se derramava pelos braços, umedecia a roupa
e resvalava até o pés como uma sombra.
Era lenta a generosidade da água.
Podíamos ver o fundo da panela,
de aço que parecia lentamente
encher de si.
A água tornou-se sólida e dura como o material que a abraçava
parecia ondular ao ir se preenchendo.
Respirávamos o ar com preguiça
enquanto sorríamos absorvidos pelos sons
que caiam fora do nosso silêncio.
A água acumulada era livre,
um só substância dentro do metal.
Transbordava e tivemos a satisfação de ver um corpo
sair de seus limites sem deixar de estar cheio ao transbordar
Também nós fomos recipiente,
cheios do som da água, respirando
o ar da chuva que não havia em nossa casa.
Nós miramos transbordar e sorrimos; éramos livres,
uma só substância cada um,
dois corpos de superfície generosa,
e no fundo de nós, a água própria
que ondulava o material do recipiente.
daqui ó http://www.laotrarevista.com/2010/08/nadia-escalante-merida-mexico/
uma sessão de beleza para a loucura
no chão do supermercado resgato
um pedacinho de papel onde se diz:
"você é uma bênção para sua geração"
isso me faz chorar
pois me lembro que ontem
mesmo perdi amigos
por causa de uma doença mental
que me esforço para controlar
há dias em que uma mulher precisa
levar à sério as compras mensais
e ignorar a longa fila de imbecis
que insistem e dizer
o jeito mais adequado de viver
ou para que a poesia
serve ou não serve
há dias de ser rígida e viva
uma estrela do mar, e carregar
em si todas as cores do mundo
um pedacinho de papel onde se diz:
"você é uma bênção para sua geração"
isso me faz chorar
pois me lembro que ontem
mesmo perdi amigos
por causa de uma doença mental
que me esforço para controlar
há dias em que uma mulher precisa
levar à sério as compras mensais
e ignorar a longa fila de imbecis
que insistem e dizer
o jeito mais adequado de viver
ou para que a poesia
serve ou não serve
há dias de ser rígida e viva
uma estrela do mar, e carregar
em si todas as cores do mundo
domingo, 16 de julho de 2017
poema sobre estar só numa manhã de domingo e estar triste
tento ser uma pessoa boa
tento não pedir perdão pelo mal que me fazem
tento não chorar toda vez que leio a adília lopes
tento não sofrer quando percebo a decepção da minha mãe
tento não usar saltos de 11 centímetros em ocasiões ordinárias
tento não manter a cabeça guardada sobre as asas como um pombo
tento lidar com alegria com o fato de estar envelhecendo na velocidade da luz
tento não pedir perdão pelo mal que me fazem
tento não chorar toda vez que leio a adília lopes
tento não sofrer quando percebo a decepção da minha mãe
tento não usar saltos de 11 centímetros em ocasiões ordinárias
tento não manter a cabeça guardada sobre as asas como um pombo
tento lidar com alegria com o fato de estar envelhecendo na velocidade da luz
terça-feira, 11 de julho de 2017
coração em conserva
você se esforça para manter entre as pálpebras
fragmentos da imagem daquilo
que, ainda que te faça sofrer
representa uma forma doce de amor
guarda sobre as asas a cabeça
pois sabe que se não guardar
há de escapar pelo vento
o cheiro do cabelo
o hálito de manhã
aquela voz, bach ao som de um oboé
não há justiça no destino, eu sei
houvesse, você teria esperado
40, 50 anos por mim
você estaria nessas esquinas da vida
o coração embrulhado em papel de seda
para me entregar
fragmentos da imagem daquilo
que, ainda que te faça sofrer
representa uma forma doce de amor
guarda sobre as asas a cabeça
pois sabe que se não guardar
há de escapar pelo vento
o cheiro do cabelo
o hálito de manhã
aquela voz, bach ao som de um oboé
não há justiça no destino, eu sei
houvesse, você teria esperado
40, 50 anos por mim
você estaria nessas esquinas da vida
o coração embrulhado em papel de seda
para me entregar
quinta-feira, 6 de julho de 2017
quando marte veio me visitar
vê esse escafandro?
matei afogado seu dono
ele jaz no meu sono da tarde
os olhos do homem, enquanto
imergia, me diziam: "como pode ser
tão ingrata com a poesia?"
despedacei papoulas
(na verdade rocei um jardim inteiro)
arranquei sem dó uma costela
(quem sabe não removo
os vestígios de adão?)
ando com medo da justiça da musa
tratado para o começo do fim
não mais tocar meus pés sobre os lençóis
não responder ao meus sorrisos
deixar o amor escorrer para o ralo
ser avarento na venda do carro
negligenciar o que se junto se faz
deliberadamente ficar para trás
deitar fora as coisas por ódio
ser mais macho que homem
impedir que eu tenha gatos
querer que eu seja menos
divorciar o tesão da poesia
não amar meus filhos
não dançar comigo
me querer menos
me silenciar
não responder ao meus sorrisos
deixar o amor escorrer para o ralo
ser avarento na venda do carro
negligenciar o que se junto se faz
deliberadamente ficar para trás
deitar fora as coisas por ódio
ser mais macho que homem
impedir que eu tenha gatos
querer que eu seja menos
divorciar o tesão da poesia
não amar meus filhos
não dançar comigo
me querer menos
me silenciar
quarta-feira, 5 de julho de 2017
21 Carolina Otero - Tradução de Norma de Souza Lopes
Chega a chuva de janeiro
aos ombros dos transeuntes.
Úmida tristeza em seus guarda-chuvas.
O frio se coloca em torno de seus pescoços.
Mas por trás da névoa da janela,
marido, tu e eu, nos entretemos
fazendo o que tão bem sabemos
fazer. E o repetimos
para causar rubor aos vizinhos
e inveja às freiras
do colégio em frente.
Outra vez, e outra vez,
que uma só não é
suficiente. A melancolia chega
para vender-nos sua enciclopédia
em enfadonhos fascículos.
Não a deixe entrar, querido,
que ponha seu ouvido na porta
e saiba que estes dois mortais
não necessitam mas que o corpo
para não morrer nunca.
nesta fria tarde.
aos ombros dos transeuntes.
Úmida tristeza em seus guarda-chuvas.
O frio se coloca em torno de seus pescoços.
Mas por trás da névoa da janela,
marido, tu e eu, nos entretemos
fazendo o que tão bem sabemos
fazer. E o repetimos
para causar rubor aos vizinhos
e inveja às freiras
do colégio em frente.
Outra vez, e outra vez,
que uma só não é
suficiente. A melancolia chega
para vender-nos sua enciclopédia
em enfadonhos fascículos.
Não a deixe entrar, querido,
que ponha seu ouvido na porta
e saiba que estes dois mortais
não necessitam mas que o corpo
para não morrer nunca.
nesta fria tarde.
terça-feira, 4 de julho de 2017
submersão
me disseram
não se atira ao amor
como um afogado
vou aprendendo com essas
cicatrizes transparentes
deixadas por quem não me toca
sorvo em pequenos goles
as carícias dos rios
que me atravessaram
estou atrasada pro trabalho
admirando o amanhecer no inverno
imita um hematoma de uma semana
contando são quase mil dias
de solidão
não se atira ao amor
como um afogado
vou aprendendo com essas
cicatrizes transparentes
deixadas por quem não me toca
sorvo em pequenos goles
as carícias dos rios
que me atravessaram
estou atrasada pro trabalho
admirando o amanhecer no inverno
imita um hematoma de uma semana
contando são quase mil dias
de solidão
domingo, 2 de julho de 2017
Se um dia me ouvires Ana Pérez Cañamares - Tradução Norma de Souza Lopes
Se um dia me ouvires
- depois de uma noite
em que me coube ser encantadora,
como essas mulheres que bebem
e se fazem de graciosas
contando piadas
de bares e ácidos e viagens
e camas e cabrões
o cabelo despenteado
e a maquiagem borrada
como se viesse
do banheiro tendo abraçado
ao tipo mais faceiro
da gafieira –
se um dia
após uma noite dessas
em que faço
de encantadora de serpentes
me ouvires dizer
que sou apenas uma fraude
tem pena de mim:
nós adictos dos aplausos
também precisamos de testemunhas
quando tiramos
a maquiagem.
- depois de uma noite
em que me coube ser encantadora,
como essas mulheres que bebem
e se fazem de graciosas
contando piadas
de bares e ácidos e viagens
e camas e cabrões
o cabelo despenteado
e a maquiagem borrada
como se viesse
do banheiro tendo abraçado
ao tipo mais faceiro
da gafieira –
se um dia
após uma noite dessas
em que faço
de encantadora de serpentes
me ouvires dizer
que sou apenas uma fraude
tem pena de mim:
nós adictos dos aplausos
também precisamos de testemunhas
quando tiramos
a maquiagem.
de tanto amor que desejo
de tanto amor que desejo
que me viro do avesso
e esqueço meu nome
e permito que me cozinhem
em fogo brando
de tanto amor que desejo
que desprezo meu sal, umidades
me esqueço que só
essas águas me lavam
apagam minhas chamas
de tanto amor que desejo
renuncio ao título
de senhora das sombras
e divido em duas as verdades
de minhas dobras e rugas
ao modo de salomão
de tanto amor que desejo
que me perco na espera
de que amantes sejam flores
e não armas de guerra
em conquista de impérios
territórios, os corações
que me viro do avesso
e esqueço meu nome
e permito que me cozinhem
em fogo brando
de tanto amor que desejo
que desprezo meu sal, umidades
me esqueço que só
essas águas me lavam
apagam minhas chamas
de tanto amor que desejo
renuncio ao título
de senhora das sombras
e divido em duas as verdades
de minhas dobras e rugas
ao modo de salomão
de tanto amor que desejo
que me perco na espera
de que amantes sejam flores
e não armas de guerra
em conquista de impérios
territórios, os corações
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