terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

promessa

haveremos de nos lembrar

entre beijos

de todo desejo

que nascerá

naquela mirada

minha cabeça

levemente erguida

entre suas coxas

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Secção

seja bem-vinda.

tome um café, fique à vontade.

entre meus dedos

minha língua

mas abrir a porta

não solta os dentes.

o que fica, quando se vai

é o gosto do café

a colher, parada dentro da caneca

Nem o nome resiste na boca

só o gosto do café

sei o que fazer.

sem som, sem explosão

cortes secos me habitam

do outro lado, ninguém se move

ou vira estátua

ou poeira

ou nada

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Desvio

Disse "apaixonada com", e riram.

Se diz "por", afirmaram,

o certo é cair em si,

amor tem direção,

feito seta, destino,

um porquê bem amarrado.


Tropeço entre preposições e promessas,

confundo léxico e laço,

sou mulher de soltar verbos no vento

e amar sem gramática.


As coisas se movem no escuro,

aves que ninguém vê.

O tempo afunda sem alarde,

a vida que era minha, espalhada

pelas ruas onde não estou.


Apaixonada com

manhãs que abrem as janelas,

café quente que escorre a saudade,

livros que não terminam em ponto final,

dança dos dias sem ensaio,

a vida, que me quer

sem correção.


A casa cheia de vento.

Meus filhos, constelações distantes,

presenças ausentes

se acomodam na mobília,

nas cadeiras que já não arrastam no chão.


Eu os fiz inteiros,

frutas esperando a faca,

o miolo dos melões,

branco, intacto, intocado,

agora longe de minhas mãos.


Quem me amaria com toda a minha força?

Quem me tomaria com a mesma fúria

com que a água arrebata os barcos?

As marés não voltam para buscar o que deixam,

os pássaros não voltam, os pássaros.


Ser aberto é um fato, mas dói.

Preciso manter-me intacta,

fruto no galho,

a escuridão no ventre dos melões.


Fui despida, entregue,

e agora restam essas mãos

vazias na câmera escura,

prendendo fitas que ninguém mais verá.


A literatura que me toca –

o grotesco, erótico,

o belo que arde estranho, imperfeito,

o perturbador em fogo baixo.


O desejo de consumir,

ser consumida no amor,

romances que sejam porto,

e naufrágio.

O imperfeito que pede a boca, os dentes.


Delírios manuscritos.

Na escrita – me perder, me encontrar.

Ser abismos e claridade.


Sou eu quem traduz febres em palavras,

quem dança com o que falta,

quem faz do erro um lume.


Não amo só por,

amo com—

com pele, riso e fome,

com tudo que me faz errar

e, ainda assim, existir.


Quem aguenta o amor,

esse animal ferido,

essa fome sem cura?